["Non... Rien de rien.../Non... Je ne regrette rien/C'est payé,/balayé, oublié,/Je m'en fous du passé!"]

terça-feira, 20 de outubro de 2015

O negro e os buracos

 Fui concebido por um buraco
Por um buraco vim ao mundo
Num buraco, foi onde vivi

Primeira cena:
Junto aos ratos...

Em buracos me meti
Crescendo solto na buraqueira
Locus amuenus é meu buraco!

Segunda cena:
Junto as vespas apocritas...

De buraco em buraco
Rompem-se as ruas pelas beiras
Que há em mim esburacada

Terceira cena:
Junto aos gatos...

Me jogaram num buraco
Com tantos outros soterrados
Buracos, de aço, quadrados

Quarta cena:
Junto aos tigres...

Aprendiz de buraco
Lacunado de minha Génesis
Meu estômago é buraco

Quinta cena:
Jantando alguns cães...

De latidos fidalgos
Desconhecidos da buracaria 
Em minha cara com o Ferro faz buraco

Sexta cena:
Longe dos homens...

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

O encontro



     Coincidentemente ou não, esta manhã (13 de outubro de 2015) acabei me deparando, sem perceber ao certo de quem se tratava, com uma figura muito importante segundo os homens. Tratava-se, era mesmo, do próprio Bandeira. Não notei de imediato que era ele ali, só vim dar conta do fato quando ele mesmo pronunciou: Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho, muito prazer! Logo após lhe perguntar a hora. Trocamos inúmeras ideias, acabei que o perseguindo em sua caminhada matinal, ele me falou do quanto era chato, hoje, todo o Antigo Recife, me falou das músicas, me perguntou: sobre o sentido dos semáforos, dos prédios tão altos e com caixas enfileiras todas iguais? Comentou que achava interessante os camelôs... Por um momento, de tanto falarmos um com o outro, sentimos ao mesmo tempo monstruosa sede, com explicação. Foi quando ele (e sua sabedoria de ancião, de quem conhecia como a palma das mãos cada beco, cada rua) disse: vamos até o Mercado Boa Vista. De início fiquei surpreso com o convite, ou mesmo assustado eu diria. Até segunda ordem ele era um estranho pra mim, e aí digo: literalmente estranho. Mesmo assim, não tive como recusar, afinal era Bandeira que estava me chamando, fiquei sem jeito de dizer não. Fomos andando mesmo (ele não tinha Vem, nem eu, e igual a mim se recusava a pagar, a passagem absurdamente cara, inteira), (outra coisa que ele também não entendeu: os ônibus e o BRT), havíamos nos encontrado na Rua da Ventura (atual Joaquim Nabuco – como assim ele me esclareceu depois), pelo caminho ele me contava fatos irrelevantes na vida de um homem cuja identidade é tão importante, como o caso de uma briga de moleque que teria pego com um tal de Valentin, afilhado de um tio avô dele, e que estudavam no mesmo colégio das irmãs Barros Barreto, na Rua da Soledade. A cada rua antiga surgia uma conversa nova... era um tal de: tá vendo aquele prédio ali?! Era um morrinho onde subíamos pra soltar papagaio; tá vendo aquela praça ali?! Tinha um lago onde pescávamos quase o dia inteiro; tá vendo aquela esquina ali?! Não existia nada nesse lugar... e assim até chegarmos ao Mercado, sentarmos e tomarmos uma cerveja. Depois de alguns minutos ele olhou para mim e educadamente disse que precisava ir, que na realidade já passava de sua hora. Sem o interromper dos horários concordei e falei apenas: Tchau poeta!
De supetão, ele voltou os olhos novamente para mim e disse:

Não julgo ser poeta!
Talvez apenas, seja eu, um colhedor de palavras
Sim,...
Porque eu simplesmente as colho

Não os frutos dessa poemeira
Mas sim... as folhas em branco que balançam
E que de manchadas


Botam poemas. 


Foi aí que percebi, que o nosso encontro era já a poesia

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Não sou... nem negro nem branco
Sou uma cor esquecida
De vermelho amarronzado

Onde o negro foi cavalo
E o branco
Chefe da cavalaria

Eu fui além de escravo
Roubado e massacrado
Dentro das próprias terras que eram minhas

Quando ainda achado pouco
Me cortaram as pernas
Os braços e corpo, sobretudo a língua

Foi-se junto com ela a esperança
Que nunca veio nem nunca esteve aqui
Mais uma invenção alva: A Esperança

deveria ser branca e não verde
Da pouca mata que se mata
Cada dia um pouco mais

Das árvores, comeram mais que cupim
Das águas, sujaram mais do que latrina
Das feridas só sobraram as feras

Virei ridiculamente uma peça animada
Nos livros de história
Com data pra comemorar

Artigo tantas vezes folclórico
Quase como um peso a ter que se carregar
Na imensidão das raças anuladas

Sim... talvez haja tantas outras tribos por aí...

De ganho só me restou mesmo o apagamento
Lento... Disfarçado de preocupações
Com a raiz de “minha” alma

Nos meus irmãos atearam fogo
E subtraíram silenciosamente a alegria
De se viver em natureza crua

TIRARAM-ME OS HÁBITOS...!

De gente que corre descalço
E com a pele toda à vista
Sob um sol de verdades ditas

O meu nome é um engano
Em real sou um filho dessa terra
Que pensavam os homens ser a índia

Muito prazer o meu nome é:

Indígena. 

16/10/2015


Como num grito de revolta
Ela se choca...
Na parede de mágoas que ali se forma
Sobre a forma de outra coisa entendida
De libra
Simplesmente desequilibra
Na balança da superfície dividida.